A calúnia, quando não queima, tisna

13 de setembro de 2007 11:23

O jornalismo investigativo tem proporcionado esclarecimentos muito úteis, sobre fatos esconsos quase sempre de natureza econômica ou política, mas corre o risco de a “fonte” usar o repórter para alcançar um objetivo de ordem pessoal. Receio que o repórter da Veja de julho deste ano possa ser um exemplo disso, quando escreveu sobre o Sivam.

O profissional entrevistou uma gama de pessoas envolvidas direta ou indiretamente com o Sivam e usou de documentos confidenciais, o que desde logo revela a quebra do sigilo de correspondência qualificada, transgressão grave de quem lhos forneceu. Junte-se a circunstância de que as entrevistas ele as obteve todas sob o compromisso de guardar segredo sobre quem as concedera -na linguagem da mídia, off the record.

Cumprindo sua missão, a matéria publicada pela revista, abre-a com a manchete fortemente inquietante para quem viaja de avião na Amazônia: “Um Buraco Negro Chamado Sivam”. Ademais, o texto é tautológico e incriminatório, a lembrar ao leitor “a inutilidade do gasto de R$ 1,7 bilhão dólares, com o Sivam que não cumpre sua finalidade”.

Ainda senador, ouvi depoimentos, em Comissão Técnica, dos Ministros Lélio Lobo, da Aeronáutica e Mário César Flores, da Secretaria de Assuntos Estratégicos, e assessores militares e civis, sobre o Projeto do Sistema de Vigilância da Amazônia e o decorrente Sistema de Proteção da Amazônia. Convenci-me da sua urgente necessidade e da capacidade de cumprir a missão de vigilância e de proteção. Se agora tomasse o avião para Belém, meu destino habitual, e lesse a manchete, forçosamente me deteria no texto que induz a concluir que o vôo seria uma perigosa aventura, pois nos buracos negros, inevitáveis, iramos voar “completamente às cegas, guiados apenas por rádio”. (Respeitei o cacófato do texto). Os que leram, como eu, a matéria, devem estar voando entre preocupados e apavorados com o risco que dos malditos “buracos negros”. Até aqui não confirmados. Talvez sejam confundidos com aguaceiros que podem prejudicar os sinais de um radar que acompanha o vôo. Atribuir a “buraco negro” o acidente da colisão fatal entre o avião da Gol e o jato Legacy, é descabido, pois o processo que investiga o desastre, em que o repórter diz basear-se, ainda nem concluiu. Uma das razões de haver votado pelo Sivam reside na possibilidade de combater o tráfego dos pequenos aviões de traficantes de drogas, que voam a pequenas altitudes, abaixo de 3 mil metros. Diz o repórter que: “Os radares não são capazes de acompanhar a rota desses aviões Nessa altitude só são detectados se voarem sobre os radares”. Ao repórter as exaustivas entrevistas não ensinaram que os aviões que voam abaixo de 3.000 metros, os “preferidos pelos traficantes e contrabandistas”, não têm os radares fixos, em princípio, a função de detectá-los, o que cabe às aeronaves-radar utilizadas com grande eficácia na vigilância desde a fronteira amazônica”.

Daí não ter cabimento a alternativa de cobrir todo o espaço aéreo com 625 radares fixos (que a matéria informa ser cálculo da Aeronáutica), alternativa economicamente inviável pelo alto custo. A despeito da formação intelectual do jornalista, ele teve de repetir o que ouviu de “fontes” técnicas devidamente protegidas por serem incógnitas.

Não seria pela balela dos “buracos negros” na Amazônia que eu temeria voar, mas pela exigüidade da pista do Aeroporto de Congonhas, na capital de São Paulo, mesmo que da moça fumadora de charuto nas festas já não dependamos na Anac.