A Investigação Criminal e Sua Direção
A respeito da competência dos delegados para presidir o inquérito policial, neste breve artigo pretendo examinar o texto constitucional (arts. 129 e 144 § 4º) que, de rigor, é aquele que rege, no inquérito policial e nas diversas funções do delegado de polícia, sua ação.
Ora, nas competências do Ministério Público, expostas no artigo 129, em nenhum momento foi declarado que o parquet teria atribuições de polícia judiciária e que, nessa condição, deveria ter o direito de presidir os inquéritos policiais, como se delegados fossem, com o direito de substituir “agente neutro” por “agente parte”, capazes de eliminar o direito de defesa do acusado.
Ao contrário, o artigo 144, § 4º, em clara e expressa dicção, determina que a polícia judiciária será exercida por delegados e por eles dirigida. Fala em delegado de polícia de carreira. Vale dizer, nem o parquet nem qualquer outro agente pode dirigir os inquéritos policiais que são o vestíbulo do processo penal. É que, por mais relevante que seja a função do parquet, ele é parte nas relações que se estabelecem e que são objeto de inquérito. Por essa razão, não lhe outorga a Lei Suprema o direito de ser “polícia judiciária”, ou seja, de ter presença neutra na investigação, na busca da verdade material.
Examinemos os dois artigos: quanto ao artigo 129, o inciso I é claro ao outorgar ao Ministério Público (parte, sempre) a competência para dar início à ação penal, na sua atuação como acusador (repito: parte) no processo criminal judiciário.
O inciso II outorga-lhe a obrigação não exclusiva de exigir respeito aos Poderes Públicos e aos serviços que presta, promovendo as medidas necessárias à sua garantia. Não há exclusividade, porque o cidadão também pode assim atuar, por ações populares ou em organizações não governamentais, pelas ações civis públicas.
O inciso III dá-lhe o direito de promover inquérito civil e ação civil pública para proteção dos patrimônios público e social, meio ambiente e outros direitos individuais e difusos. Cuida, exclusivamente, de questões civis – não criminais. Por que razão não colocou, o constituinte, nesse inciso, também o direito de promover os inquéritos penais? Nitidamente, porque essa matéria teria expressa previsão no § 4º, do artigo 144, que não declara ser o Ministério Público polícia judiciária. Também o cidadão comum, individualmente, mediante ações populares e em organismos sociais, valendo-se de ação civil pública, pode promover tal proteção.
O controle concentrado de constitucionalidade é objeto do quarto inciso, também sem exclusividade, o mesmo ocorrendo com as representações para fins de intervenção.
O inciso V está vinculado à defesa dos direitos e interesses das populações indígenas, vinculando-se, pois, aos artigos 231 caput e 232.
O inciso VI diz respeito a procedimentos administrativos, não penais.
O inciso VII não pressupõe nenhum poder investigatório, mas apenas de controle da atividade policial. Vale dizer, de verificar se a autoridade policial está agindo dentro da lei. A lei complementar, que apenas explicita a Lei Suprema, não poderia ofertar poderes maiores que aqueles outorgados pela Lei Suprema, que, no caso, consiste no mero controle externo. Tal controle também pode ser exercido por qualquer cidadão por ações populares ou, em organizações, por meio de ações civis públicas. Apenas a ação penal é de competência exclusiva do Ministério Público.
No inciso VIII, é a clara afirmação de que o Ministério Público não pode presidir o inquérito policial, mas apenas requisitar diligências investigatórias e instauração do inquérito policial.
O inciso IX, de caráter geral, permite ao Ministério Público atuar em outras funções não colidentes com aquelas definidas na Constituição.
Por outro lado, o § 4º do artigo 144, clara, nítida e inequivocamente declara que a polícia judiciária, aquela a quem cabe conduzir o inquérito policial, deve ser exercida por delegados de polícia.
Exerce o delegado, portanto, uma carreira jurídica, sendo polícia judiciária, no vestíbulo da ação penal, como longa manus do Poder Judiciário, para garantir a imparcialidade do inquérito, ofertando idênticas possibilidades de atuação ao Ministério Público e à Advocacia, na busca da verdade material dos fatos presumivelmente delituosos.