“A possibilidade do pagamento da fiança por meio de cheque ou outros meios eletrônicos”

30 de abril de 2013 10:08

O instituto da fiança está previsto nos artigos 321 a 350 do Código de Processo Penal. É verdade que em nenhum dos seus dispositivos prevê expressamente o pagamento da fiança por meio de cheque ou outro meio eletrônico. Porém, ainda que tenha sofrido diversas alterações recentes, o diploma processual possui inúmeros artigos da época de sua instituição em 1941.

Podemos observar que a redação do art. 330 do CPP não sofreu nenhuma alteração, mantendo-se a sua redação originária no que tange ao pagamento da fiança por pedras, objetos, metais preciosos, títulos públicos e hipoteca rememorando a uma época em que tais pagamentos eram comumente utilizados.

O próprio cheque, mesmo ainda sendo utilizado, vem perdendo espaço nos usos e costumes da população e certamente um dia veremos a sua extinção, sendo substituído pelo uso de cartões eletrônicos e outros meios proporcionados pelo avanço tecnológico.

A Receita Federal do Brasil já admite o pagamento dos tributos federais incidentes sobre a bagagem fora da cota de isenção por meio do cartão de crédito e débito nos aeroportos internacionais de grande movimento.

Imaginemos que num plantão policial ou até mesmo judiciário de final de semana ou feriados o preso seja apresentado as autoridades competentes que naquele momento arbitraram o valor da fiança em 10 salários mínimos, equivalentes aproximadamente a R$ 7.000,00 conforme disposto no art. 325, I, do CPP, salientando-se de que hoje a fiança pode ser arbitrada em valores que superam a quantia de 200 salários mínimos aumentada em 1000 vezes por força do inciso III do mesmo dispositivo legal.

Na hipótese acima o preso ou alguém por ele jamais conseguirá levantar quantia elevada, tendo em vista que em regra ninguém mantém em casa montante significativo em espécie, e sendo fim de semana, feriado ou até mesmo a noite, não há funcionamento de bancos, não permitindo os caixas automáticos saques em quantia superior a R$ 1000,00 o que acaba por impedir que o autuado responda ao inquérito ou ao processo solto, que é a regra no direito brasileiro.

O pagamento por meio de cheque em nada prejudicará a administração da justiça, pois caso o cheque seja devolvido por falta de fundos, nada impede que o preso seja processado também pelo crime de estelionato, previsto no art. 171, § 2º, VI do CP, podendo o Juiz neste caso, decretar medida cautelar diversa da prisão ou até mesmo a prisão preventiva se os pressupostos, fundamentos e requisitos objetivos estiverem presentes.

Podemos dizer também que o fato do investigado ou réu responder a inquérito ou a processo solto não trará maior insegurança à população caso o pagamento seja aceito por meio da cártula, já que os crimes de maior gravidade não permitem que o preso preste fiança, a exemplo dos crimes hediondos, equiparados, racismo e os com pena superior a 4 anos de prisão caso seja o delegado de polícia a autoridade responsável pelo arbitramento.

Por fim, entendemos que a permissão encontra guarida no art. 3º do CPP onde dispõe que a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito, razão pela qual deve o delegado de polícia ou o juiz de direito como garantidores dos direitos dos cidadãos permitirem que seja conferido ao instituto da fiança a máxima efetividade possível, tendo em vista tratar-se de um direito subjetivo do preso quando se está em jogo o bem jurídico liberdade, bem este que só não se sobrepõe ao direito a vida.

Sobre o autor

Rafael Potsch Andreata é Delegado de Polícia Federal, especialista em Direito penal e processual penal.