Alstom pagou políticos via offshore

8 de maio de 2008 12:55

A Polícia Federal apreendeu em 2006 dois comprovantes de transferência bancária que apontam, segundo interpretação de delegados, que a Alstom teria pago comissão a políticos brasileiros. Os extratos bancários mostram que a filial da Alstom na Suíça transferiu US$ 550 mil (R$ 930 mil em valores atuais) e 220 mil (R$ 573 mil) para uma empresa do Uruguai chamada Aranza, de acordo com documentos sigilosos da PF obtidos pela Folha.

Um dos sócios da Aranza, Luiz Geraldo Tourinho Costa, contou em depoimento à PF que nunca fez negócios com a Alstom. Disse que havia cedido a conta em troca de um percentual de 5% sobre os valores transferidos. O dinheiro, segundo ele, foi usado pela Alstom para pagar “comissão” a políticos. Em conversas com os policiais, Tourinho Neto disse que as obras pelas quais a Alstom pagara comissão seriam licitadas pela Eletronorte e por Furnas. Os comprovantes das transferências estavam na casa dele, em São Paulo.

A Alstom, uma das maiores empresas da França, está sob investigação naquele país e na Suíça sob suspeita de pagamento de propinas e lavagem de dinheiro. A investigação foi iniciada em 2004, quando auditores descobriram a transferência de perto de 20 milhões das contas da Alstom para empresas fantasmas da Suíça e de Lichtenstein.

As empresas fantasmas seriam encarregadas de distribuir a propina em países nos quais a Alstom tocava obras, como Brasil, Venezuela, Cingapura e Indonésia.

Reportagem publicada anteontem pelo “Wall Street Journal” revelou que a Promotoria daqueles dois países têm documentos segundo os quais a Alstom teria pago US$ 6,8 milhões a políticos para ganhar uma licitação de US$ 45 milhões do Metrô de São Paulo.

O sumiço
Os comprovantes da transferência da Alstom da Suíça para a empresa uruguaia foram apreendidos durante a Operação Castores da PF, que investigava em Curitiba um golpe contra a Itaipu Binacional e outras companhias de energia. À época, um diretor da Alstom, Osvaldo Panzarini, foi preso e a PF fez buscas na sede da empresa em São Paulo.

O sócio da empresa uruguaia que recebeu os dois depósitos contou à PF ter cedido a conta a pedido de José Reis, vice-presidente da Alstom entre 1999 e 2004 e responsável pelos negócios da empresa na área energética. Em depoimento à PF, Reis disse que não tinha conhecimento dos depósitos.

Segundo o advogado de Reis, Eduardo Muylaert, o nome do vice-presidente da Alstom foi citado “para despistar a investigação” (leia texto ao lado).

Logo depois do depoimento do ex-vice-presidente da Alstom, a Justiça do Paraná julgou que era melhor desmembrar a investigação e remeter a parte em que a Eletronorte era citada para Brasília – a sede da empresa é naquela cidade.

A Folha, porém, não conseguiu localizar o eventual inquérito. Dois advogados consultados pela reportagem disseram que não conseguiram encontrar as peças da investigação.

O golpe
Tourinho Costa, que tinha os comprovantes dos depósitos da Alstom da Suíça, foi investigado pela PF sob a suspeita de que aplicava um golpe contra as maiores empresas hidrelétricas do país (Itaipu, Eletrobrás, Eletronorte e Furnas).

Ele e seu sócio, Laércio Pedroso, tinham uma empresa de consultoria que dizia a fornecedoras dessas companhias que elas tinham valores a receber que não haviam sido contabilizados -seriam restos a pagar. Alegavam também que conseguiam obter esses dados porque tinham acesso a informações confidenciais de Itaipu. Foi a diretoria da Itaipu Binacional que pediu a investigação.

À época, os dois sócios foram presos pela PF, mas o inquérito concluiu que não houve prejuízos para Itaipu.

Outros dois inquéritos sugeridos pelos policiais do Paraná, sobre os recursos enviados pela Alstom da Suíça e sobre a Eletronorte e Furnas, não ficaram prontos até agora.