Calote vai parar na Justiça

13 de setembro de 2007 11:09

A partir da primeira quinzena de julho, quando o pagamento da maioria das diárias foi interrompido, os policiais tiveram de tirar do próprio bolso os custos com hospedagem, transporte e alimentação para trabalhar no Pan. O Ministério da Justiça, responsável pelo pagamento da corporação, admite que as diárias dobradas – no valor de R$ 240, que deveriam ser dadas a todos os servidores federais durante o evento esportivo – não estavam previstas no orçamento. Ainda de acordo com a União, toda a dívida será quitada até segunda-feira.

– Ninguém estava preparado para a diária em dobro – ressalta o delegado Daniel Sampaio, coordenador do esquema de segurança da PF no Pan. – Conseguimos pagar uma parte da dívida porque, na última hora, parte do efetivo foi liberado, já que vieram bem menos chefes de Estado do que esperávamos. Mas os policiais não estão preocupados. Como não há previsão legal para o dinheiro, todos sabiam que a verba atrasaria.

Francisco Carlos Sabino, diretor de Relações de Trabalho da Fenapef, é menos paciente. Em São Paulo, segundo o dirigente, 130 policiais receberam apenas o equivalente a um mês de trabalho, embora tenham passado 60 dias no Rio. Como precisaram bancar a própria estadia, muitos procuram o sindicato local para conseguir empréstimos.

– O Pan provocou um efeito dominó na conta de cada agente. Com o dinheiro que recebem agora, estão pagando as dívidas do mês anterior – lamenta. – A Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) e a diretoria-geral da PF insistem no jogo de empurra. Ninguém assume a dívida.

Para evitar atraso no pagamento de diárias, a Fenapef conseguiu, há três anos, um mandado de segurança coletivo que desobriga policiais federais de cumprirem missões em outros Estados sem receber antecipadamente as diárias. A decisão não foi derrubada pela diretoria-geral da PF.

Embora tenham apoio jurídico para recusar trabalhos como o Pan, a maioria dos agentes não o faz, por medo de represálias. O grupo convocado ao evento esportivo era ainda mais suscetível a avaliações negativas – muitos, segundo Sabino, ainda estavam em “estado probatório”, ou seja, em fase de avaliação para se tornarem efetivamente policiais federais. Se declinassem da missão, poderiam comprometer o modo como eram vistos por seus superiores.

– O Rio é uma cidade cara e os preços aumentaram ainda mais no Pan – lembra um agente da PF, que trabalhou na cidade durante o evento e não quis se identificar. – Tínhamos de arcar com hospedagem e alimentação. No fim das contas, nós pagamos para trabalhar.

A apenas 10 dias do Pan, um decreto presidencial, publicado no Diário Oficial da União, aumentou em 100% a diária de todos os servidores federais que trabalhariam no Rio durante a competição. A quantia, assim, passaria de R$ 120 para R$ 240. Mas só no dia 31 de agosto, quase dois meses depois, o ministro da Justiça, Tarso Genro, solicitou ao Ministério do Planejamento a abertura de crédito extraordinário em favor da Senasp para o pagamento devido.

Para a Força Nacional, a União deve até R$ 7 milhões. A tropa ameaça abandonar o Estado caso as diárias atrasadas não sejam pagas, conforme revelou ontem o Jornal do Brasil. O comandante da Força, Luiz Antônio Ferreira, criticou os possíveis desertores e mandou apurar quem são os agentes revoltados.

– O policial que estiver insatisfeito deve ir embora – desafia. – É fácil mobilizar tropas para repor ausências.

Os agentes da Força Nacional ganharam ontem uma ajuda inesperada. Alegando ter se comovido com o drama da tropa federal, o presidente do Clube de Cabos e Soldados da Polícia Militar, Jorge Lobão, resolveu oferecer aos boinas-vermelhas uma cesta básica quinzenal. Entre os alimentos disponíveis estão farinha de trigo, fubá, macarrão, feijão e arroz, além de latas de ervilha e sardinha.

– Tive uma crise com a FNS, porque a remuneração que eles recebiam era uma ofensa ao salário de um policial militar – desabafa Lobão. – Mas não adianta receber muito no papel se nada chega à conta.