Comentário: A turma da jogatina quer ganhar a parada

3 de outubro de 2007 11:23

Três dias antes desse misterioso acontecimento, o país havia assistido à cena de um subchefe da Casa Civil recebendo uma sacola de dinheiro de um contraventor.
(Quando a cena foi filmada, Waldomiro Diniz não trabalhava no Planalto.) Veio a fúria moralizante, instalou-se uma CPI, e ela recomendou a criação de um marco legal para o jogo.

Apareceu um projeto no Senado dando aos Estados o poder de distribuir concessões para a exploração de loterias. Ele foi aprovado no dia 8 de fevereiro. Três dias antes, a Polícia Federal gravara uma conversa do bicheiro Aniz Abraão para um amigo, pedindo o telefone de um senador. Associar uma coisa à outra pode ser maledicência mas, ocorrida a votação, o advogado Júlio Guimarães, em cuja casa seriam encontrados R$ 10 milhões atrás de uma parede falsa, disse o seguinte a um colega: Passou no Senado e vai passar na Câmara. Nós vamos ganhar essa parada. Confia em mim. Se ninguém fizer nada, a turma da jogatina ganha essa parada. O regime de concessões estaduais abre caminho para exorbitâncias e contravenções.

Em Pernambuco há a idéia de se conceder a exploração de uma loteria que poderá arrecadar R$ 840 milhões, repassando ao Estado R$ 6 milhões. Ou seja, vão avançar sobre o dinheiro da patuléia, deixando migalhas para a sociedade.

O projeto aprovado pelo Senado vai a voto hoje na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara. A ligação de Genival Inácio da Silva, o Vavá, com um mercador de apostas da Baixada Santista fez com que o próprio presidente da República caísse num grampo da Polícia Federal. (Era uma conversa banal, sobre a saúde de um amigo, e Lula foi ao telefone porque estava na casa para onde o sócio da casa de jogo telefonou.)Pretende-se dar legitimidade federal aos concessionários estaduais da jogatina. O projeto é suficientemente vago para que cada governador se transforme num distribuidor de licenças de jogatina. As máquinas de caça-níqueis, por exemplo, são loterias eletrônicas e não há quem possa negar isso. Pretendem inverter a regra. A lei diz que o jogo é proibido no Brasil. Os senadores, os bicheiros e um lote de deputados querem definir quais jogos são permitidos, por quem.

Atualmente, doze Estados têm loterias estaduais (Waldomiro Diniz trabalhava numa delas), e o governo federal, por meio da Caixa Econômica, opera dez modalidades de tavolagem. A última, criada por Lula, destinase a sanear a ruína dos clubes de futebol saqueados pelos cartolas.

Uma pesquisa de 2004 indicou que 90% dos apostadores nas loterias federais ganham entre R$ 500 e R$ 700. A jogatina federal tira dinheiro da patuléia mas, bem ou mal, coloca-o nas arcas da Viúva. A privataria das concessões lotéricas colocará o ervanário no bolso de empresários, mais ou menos vinculados à traficância e às corrupções, executivas e legislativas.

ELIO GASPARI é jornalista.