Crime permanente, diz delegado sobre fraude no Bolsa Família no RS

17 de dezembro de 2013 12:21

A Polícia Federal e o Ministério Público investigam a fraude envolvendo o Bolsa Família em Barra do Quaraí, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. De acordo com o delegado André Luiz Martins Epifânio, as pessoas envolvidas no esquema "estão em crime permanente". As autoridades já apuraram que golpistas usam endereços falsos para se cadastrar no programa. Estrangeiros, servidores públicos e estagiários da prefeitura e inclusive mortos são contemplados, como mostra a reportagem do Jornal do Almoço, da RBS TV.

"Se estão trabalhando, têm um meio de subsistência e estão recebendo o benefício em detrimento de pessoas que não têm as mínimas condições de subsistência, estão em crime permanente", aponta o delegado.
 

Tanto para a PF como para o MP, os problemas no município gaúcho estão diretamente ligados a fraudes eleitorais. O promotor Rodrigo de Oliveira Vieira explica que uruguaios ganham Bolsa Família, aposentadoria e, em troca, se inscrevem como eleitores. "Na próxima eleição, dão o voto a quem presta esse favor", diz ele.

"Alguns até vêm se alistando em Barra do Quaraí como eleitores, até como forma de comprovação dessa residência. Mas todos esses casos nós encaminhamos à Polícia Federal, que já tem inquéritos instaurados e está investigando", completa a procuradora da República em Uruguaiana Bruna Pfaffenzeller.
 

Pelo menos 367 famílias do município de cerca de quatro mil habitantes recebem o auxílio do Bolsa Família, criado exclusivamente para contemplar pessoas de baixa renda. Seis pessoas que dizem morar em Barra do Quaraí foram localizadas em Bella Unión. Entre elas está Adalberto, que registrou como residência um terreno baldio. Outra casa, que pertence ao pedreiro André Ferreira, é a campeã no ranking dos endereços falsos. Mais de 30 pessoas afirmam morar no local.

Três pessoas aparecem como moradores em um terreno onde existe apenas uma caixa d`água. Conforme documentos fornecidos pelo Ministério Público, outras quatro dizem morar em um local onde há apenas uma antena de telefone.
 

No cemitério de Barra do Quaraí, outra fraude desvendada. Saques em nome de Márcia Ortiz Dedéco, falecida em março de 2010, foram realizados até janeiro deste ano, de acordo com o Portal da Transparência. A irmã de Márcia, Cláudia Ortiz Dedéco, trabalha desde 2004 na Secretaria de Assistência Social do município, onde são feitos os cadastros para receber o Bolsa Família. Ela seria uma das responsáveis pelo programa na cidade, mas não soube explicar por que os valores continuaram sendo pagos à irmã. Cláudia não quis gravar entrevista.

Na lista do Bolsa Família no município também estão 29 funcionários da prefeitura. Estagiários, auxiliares administrativos e até pessoas com cargos de chefia fazem parte da relação. É o caso de Eliane Senoranes, que aparece em documentos oficiais como chefe da seção. "Sou eu que recebo, eu mesmo. Quando me inscrevi, não trabalhava, era desempregada e permaneci", justificou a colaboradora.

O vice-prefeito da cidade, Danilo Rodrigues (PT), não vê problema em contemplar funcionários públicos. "O cidadão pode estar trabalhando na prefeitura ou numa empresa particular, mas a renda pode ser divida pelo número de pessoas que residem no domicílio. Se for inferior a R$ 140, a pessoa tem direito ao benefício do Bolsa Família", argumenta Rodrigues.
 

Porém, Eliane recebe um salário de R$ 787,79, tem uma filha e mora com os pais, donos de um armazém. Mesmo que ninguém mais trabalhasse na família, e todos dependessem dela, ainda assim a situação não se encaixaria nas regras do programa.

O vice-prefeito também foi secretário de Assistência Social de Barra do Quaraí e gestor do Bolsa Família até o ano passado. Ele se mostrou surpreso e disse não saber nada sobre as suspeitas sobre estrangeiros recebendo auxílio. "Uruguaios recebendo eu desconheço", afirmou. O prefeito Iad Sholi (PSB) estava em uma viagem oficial ao Uruguai, conforme informou a prefeitura.

Além de crime eleitoral e suspeita de receber o Bolsa Família sem necessidade, a polícia também investiga outro beneficiamento social, o Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), programa do governo federal que beneficia idosos que nunca contribuíram com a Previdência, mas que necessitam de ajuda financeira. Trata-se de uma espécie de aposentadoria, que tem como pagamento um salário mínimo.