Curso testa limites dos policiais fluminenses

15 de outubro de 2007 09:03

A cena não foi extraída do filme Tropa de elite, mas do mais rigoroso dos cursos da Academia de Polícia (Acadepol) que, neste dia, acontecia no quartel do Grupamento Marítimo do Corpo de Bombeiros, em Copacabana. Depois dessa etapa, os policiais ainda têm de disparar em torno de 2.500 tiros de diversos calibres e até se tornar alvo de armas não letais. Os policiais aprendem também a conhecer o inimigo – premissa fundamental em ações das Forças Armadas – e organizam as operações de acordo com a quadrilha a ser combatida e com a personalidade do chefe do morro.

Além de policiais de outros Estados que vêm ao Rio fazer o curso para depois implantá-lo em sua terra natal, como mostrou ontem o Jornal do Brasil, também fazem os testes agentes da Polícia Federal, Rodoviária, Militar, Civil e até oficiais do Exército. A Acadepol tem um projeto para tornar o curso obrigatório para os policiais que desejam fazer parte da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core). Atualmente, os policiais que compõem o braço de elite da Polícia Civil são indicados a partir de suas atuações.

O treinamento submete os policiais ao contato direto com armas não letais, como spray de pimenta e gás lacrimogêneo. Treinamentos do Exército, como incursões sem fim pela mata adentro, ou da Marinha, como pular de um helicóptero no mar. Apesar de no Rio não se ter notícia de ilhas dominadas pelo tráfico, o coordenador do CAT, delegado Jader Amaral, explica que o objetivo é saturar o aluno e adaptá-lo às situações mais adversas.

– Os policiais podem ter de passar pelas mais adversas situações, por isso é necessário prepará-los sempre para o pior – justifica.

Os policiais aprendem – na teoria e na prática – táticas usadas por militares ao invadir território inimigo, como conduta de patrulhas e deslocamento em território urbano. O curso começa às 6h e nunca termina antes das 22h – muitas vezes virando a noite e, por vezes, entrando no fim de semana. Cada aluno dá em torno de 2.500 tiros de fuzil, submetralhadora, pistola e espingarda de calibre 12.

Os alunos não sabem a programação do dia seguinte nem quando o curso vai terminar. Além do G-Mar, onde treinam operações no mar, os policiais fazem rapel e incursões na mata da Pedra da Gávea, ocupam as favelas onde o Bope treina e suam nas pistas de obstáculos do Centro de Instruções de Operações Especiais do Exército.

Apesar de adaptarem as táticas militares às operações em zonas urbanas, o treinamento dos policiais egressos da Acadepol exige um princípio básico do militarismo: conhecer o inimigo. Antes de cada incursão, os comandantes reúnem-se em torno de fotos aéreas e terrestres das favelas, estudam a quadrilha que domina o local e até os possíveis arsenais disponíveis com os traficantes. Como em qualquer guerra.

– Cada ação é preparada como uma operação militar, no sentido da logística que se exige – explica o diretor da Acadepol, Pedro Lomba. – Cada quadrilha tem um modo de atuação diferente, e isso também influencia na hora de organizar a ação. Leva-se em conta até a personalidade do chefe do tráfico a ser combatido.

Segundo Lomba, o estudo é necessário porque há locais que têm histórico de sustentar confrontos, como no caso do Complexo do Alemão, considerado o QG do Comando Vermelho. Na megaoperação realizada em 27 de junho, por exemplo, um grupo de atiradores de elite ficou posicionado no alto da favela da Grota com visão privilegiada de todo o vale de favelas que compõem o complexo. Eles deram a cobertura necessária para que os 1.350 homens pudessem avançar na favela sem serem atacados das casamatas construídas pelos traficantes.

Até fotos de satélite são usadas na hora de estudar o inimigo, a fim de identificar possíveis trincheiras e depósito de armas. Atenta a isso, a Acadepol criou um curso de inteligência, no qual, os candidatos só são aprovados depois de terem suas vidas investigadas.