De olho na segurança
Não foi necessário esperar pelos primeiros episódios de violência. Assim que desembarcaram, às vésperas do início da Copa do Mundo, cinco torcedores argentinos (dois em Foz do Iguaçu, dois no Rio de Janeiro e um em São Paulo) foram identificados como "barras bravas", apelido dado aos baderneiros que infestam os estádios do país da presidente Cristina Kirchner. Reconhecidos por terem esfaqueado torcedores ingleses na Copa do Mundo de 1986, no México, eles foram imediatamente despachados de volta para a Argentina.
O episódio foi a primeira ação bem-sucedida da Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos, fruto da integração entre as três esferas de governo, os órgãos de controle de imigração, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária, além de uma parceria entre os governos argentino e brasileiro para a troca de informações sobre os mais de dois mil arruaceiros fichados e banidos do futebol pela Justiça hermana.
Mais do que garantir a tranquilidade dos turistas brasileiros e estrangeiros durante o evento da Fifa, esse trabalho conjunto é um legado que já está sendo aproveitado pelos moradores das 12 cidades-sede, de acordo com o delegado da Polícia Federal Andrei Augusto Passos Rodrigues, secretário Extraordinário de Segurança para os Grandes Eventos. "A Copa vai deixar um legado de um ambiente que reúne dados e informações, além da capacidade das três esferas de governo, das forças de segurança e dos órgãos de controle de trabalhar juntos, em prol de um objetivo comum", diz Rodrigues (leia entrevista ao final da reportagem).
Com um investimento de R$ 1,17 bilhão, o governo federal construiu ou reformou 15 prédios públicos, que agora sediam os Centros Integrados de Comando e Controle, onde equipes das polícias, da defesa civil, dos corpos de bombeiros e até agentes de trânsito trabalham lado a lado, todos os dias da semana. Além das unidades instaladas em cada uma das 12 cidades-sede, há um centro nacional em Brasília, outro que serve de back up no Rio de Janeiro e um Centro de Cooperação Policial Internacional, também na capital federal.
O QG principal, uma espécie de Big Brother nativo, está instalado em Brasília, numa sala com 438 m², 56 monitores integrados e 300 profissionais que se revezam numa vigilância de 24 horas por dia. Antes mesmo que os aviões das 32 seleções que estão participando da Copa pousassem nos aeroportos brasileiros, os órgãos de segurança e controle brasileiros já conheciam os trajetos a serem percorridos e os pontos de parada, garantindo o policiamento ostensivo em cada um deles, executado com o apoio da segurança privada dos hotéis em que se hospedariam.
Diante de imprevistos, as equipes podem tomar decisões minuto a minuto, já que estão reunidas em um mesmo ambiente. Até mesmo questões burocráticas, como as que envolvem a Receita Federal e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), são resolvidas nesses centros integrados, que possuem telões com monitores de tevê, que captam imagens de três mil câmeras espalhadas em pontos estratégicos das cidades. A maior fatia dos recursos investidos foi aplicada na compra de equipamentos de alta tecnologia, que incluem viaturas, smartphones e sistemas de câmeras e georreferenciamento.
Há também inovações nos sistemas de transferência de imagens em tempo real. Além dos veículos aéreos não tripulados, os chamados drones, o Brasil equipou helicópteros com câmeras de alta precisão, que transmitem imagens em infravermelho, à noite. As polícias militares estaduais, por seu turno, receberam novos equipamentos para conter manifestações, como robôs antibombas e munição não letal. Apesar do treinamento dos policiais, não faltaram reclamações de manifestantes nos primeiros dias da Copa do Mundo.
Entidades de defesa dos direitos humanos acusam a polícia de ter usado força injustificada e desproporcional durante os protestos. "As autoridades brasileiras prometem que a inauguração do Mundial será uma celebração, enquanto a polícia reprime brutalmente manifestantes pacíficos em São Paulo, ferindo pelo menos dois jornalistas", afirmou a Anistia Internacional, em comunicado oficial. Na abertura da Copa, houve protestos durante seis horas na capital paulista.
Pelo menos 12 pessoas ficaram feridas, entre elas cinco jornalistas, dois deles estrangeiros, e 43 pessoas foram detidas. Em nota, a Polícia Militar de São Paulo informou que agiu "para impedir que baderneiros fechassem a Radial Leste", a principal avenida de acesso à Arena São Paulo, mais conhecida como Itaquerão. Com ajustes pontuais na conduta policial, o secretário Extraordinário de Segurança para Grandes Eventos acredita que o esquema de segurança será aplaudido por todos. E o melhor: o Big Brother continuará no ar depois da Copa do Mundo.
Entrevista com Andrei Augusto Passos Rodrigues, secretário extraordinário de Segurança para Grandes Eventos
Quais foram os investimentos realizados para garantir a segurança na Copa do Mundo?
Foi destinado R$ 1,17 bilhão para montar todo um aparato, composto por 15 centros de controle, operados pelas forças de segurança em colaboração com a Receita Federal, Anvisa e Infraero. Hoje, o Brasil tem o que há de mais moderno em segurança.
Qual é a importância dessa gestão integrada?
Com exceção do Rio, o conceito de ação integrada simplesmente não existia. A Copa vai deixar um legado de um ambiente que reúne dados e informações, além da capacidade das três esferas de governo, das forças de segurança e dos órgãos de controle de trabalhar por um objetivo comum. Mais de cinco mil câmeras ficarão para as cidades. As pessoas vão poder usufruir dessa tecnologia para segurança cotidiana, o que, aliás, já vinha acontecendo antes da Copa. Em Natal, toda a operação da Polícia Militar foi transferida para o Centro há meses. O cidadão que ligar para o telefone 190 já é atendido nesse ambiente.
Foi feito algum treinamento dos policiais para atuar nas manifestações, sem generalizar a violência?
O policial não generaliza a violência. Fizemos um grande workshop depois da Copa das Confederações, em que ouvimos vários segmentos da sociedade, como jornalistas e representantes dos movimentos sociais. Construímos um modelo de boas práticas para serem difundidas em todas as unidades, capacitando os comandantes dos batalhões.