Delegada Erika Mialik Marena fala sobre Lava Jato

15 de janeiro de 2016 12:02

Representante da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) no Paraná, a delegada Erika Mialik Marena concedeu nesta semana entrevista ao Blog do Elimar Côrtes para falar de um tema de interesse de toda a população brasileira: a Operação Lava Jato.  Entretanto, ao concordar com a entrevista, ela fez questão de deixar claro que falaria “na condição de representante da ADPF” no Paraná. Portanto, pondera a delegada, “como representante classista, não me cabe falar de detalhes de investigação em curso”.

A coordenação geral da Operação Lava Jato no Paraná é do delegado Regional de Combate ao Crime Organizado, Igor Romário de Paula. E no âmbito das investigações de Brasília, a coordenação é de responsabilidade do delegado federal Josélio  Azevedo de Souza.

Erika Marena é uma das integrantes do grupo de trabalho no Paraná, juntamente com outros delegados. Ela, no entanto, já foi coordenadora da Lava Jato quando a operação estava no âmbito da Delegacia de Combate a Crimes Financeiros e Desvio de Recursos Públicos (DELEFIN). Na ocasião, Erika Marena era a chefe da DELEFIN, uma das unidades da Superintendência Regional da Polícia Federal no Paraná.

“Mas a fim de não paralisar todos os demais casos daquela Delegacia, resolvemos então formar um grupo de trabalho à parte vinculado diretamente à Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado para dar sequência à Lava Jato”, explica Erika Marena, que é uma das coordenadoras do grupo, juntamente com outros delegados federais mais antigos no caso – todos vinculados diretamente ao delegado Regional de Crime Organizado no Paraná.

Nesta entrevista exclusiva, a delegada Erika Marena afirma que “a  Operação Lava Jato ainda pode levar a um grande número de descobertas de corrupção no País”. No entanto, ela teme que “se o caso continuar sendo desmembrado para outros Estados, podemos acabar perdendo a ligação entre as evidências já existentes.”

Mais adiante, destaca que delegados e demais policiais federais que integram a Força Tarefa da Operação Lava Jato às vezes trabalham até doentes e longe da família. E ela fica indignada com a descoberta de tanta corrupção e roubo de dinheiro público durante as investigações da Lava Jato: “É chocante constatar como o sistema estava podre e como muitos empresários ganharam dinheiro no País às custas de corromperem agentes públicos. A corrupção é um câncer na economia…Não podemos perder nunca a capacidade de nos chocar com qualquer ato de corrupção, seja qual for o valor envolvido.”

Blog do Elimar Côrtes – Quando a senhora entrou para a Polícia Federal e unidades por onde passou?
Erika Mialik Marena – Em 2003, trabalhei em São Paulo/SP e Curitiba/PR, sempre na área de crimes financeiros e lavagem de dinheiro. Aqui em Curitiba, já estive à frente DELEFIN (Delegacia de Combate a Crimes Financeiros e Desvio de Recursos Públicos). Hoje eu integro o Grupo de Trabalho da Operação Lava Jato, que está fora da estrutura das Delegacias da Superintendência Regional da Polícia Federal no Paraná. Devido à dimensão atingida no caso, foi necessário se criar uma estrutura maior do que qualquer delegacia da unidade para poder dar conta da demanda.

– Em que fase a Operação Lava Jato se encontra hoje no âmbito da Polícia Federal, já que há desdobramentos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF)?

– A Operação Lava Jato é composta pelos inquéritos policiais e ações penais que tramitam em primeira instância, isto é, que não abrangem investigados com prerrogativa de foro; e pelos inquéritos policiais e ações penais que tramitam perante o STF e o STJ. Aí, temos outro grupo da Polícia Federal que cuida dos casos que são investigados em Brasília.

A Operação Lava Jato ainda pode levar a um grande número de descobertas de corrupção no País. Ocorre que, se o caso continuar sendo desmembrado para outros Estados, podemos acabar perdendo a ligação entre as evidências já existentes. Aquilo que ainda está tramitando no Paraná, será aprofundado e exaurido e apresentado ao Ministério Público e à Justiça Federal.

– A Polícia Federal recebe ajuda dos serviços de Inteligência de outras polícias estrangeiras nessas investigações?

– Vários países estão cooperando no caso, assim como a Polícia Federal também presta auxílio a demandas de suas congêneres externas.

– É correto quando a imprensa se refere aos delegados e delegadas federais como “os investigadores da Lava Jato?”

– Não existe o cargo de “investigador” no âmbito da Polícia Federal. O delegado de Polícia é o responsável legal pela condução da investigação, auxiliado por equipe de agentes, escrivães, peritos e servidores da área administrativa da Polícia Federal. Esse rol de pessoas forma a equipe de investigação, que é o modelo de trabalho usado no âmbito da Lava Jato.

– Qual o tamanho da equipe da Lava Jato no Paraná?

– A nossa equipe no Paraná conta com cerca de 10 delegados, todos responsáveis por inquéritos do caso Lava Jato, e um número variável de policiais, variando entre 10 e 20 agentes e peritos.

– O tamanho da equipe é satisfatório para o prosseguimento das investigações?

– O tamanho da equipe é insuficiente, mas isso decorre da falta de efetivo na instituição como um todo. A manutenção de uma equipe mínima para a Lava Jato no Paraná implica no sacrifício de várias outras unidades pelo País, que cedem esses policiais. Contudo, acreditamos que se a prioridade é o combate à corrupção, a instituição tem que usar esse critério para definir o direcionamento dos recursos humanos existentes.

– O corte de R$ 135 milhões no orçamento da Polícia Federal para este ano poderá afetar de alguma forma as investigações da Lava Jato?

– Aparentemente esse tema está superado, pois, com a mobilização dos delegados, o Governo Federal noticiou que buscará recompor os valores glosados. Contudo, essa recomposição apenas evitará o caos, mas não é suficiente para permitir o incremento na atuação da instituição,  já que desde 2007 a Polícia Federal vem perdendo investimentos do Governo Federal. Não obstante, acreditamos na palavra dada pelo ministro da Justiça (José Eduardo Cardozo) no sentido de que não faltarão recursos para a Operação Lava Jato.

– Como é o dia a dia dos delegados que atuam na Força Tarefa da Lava Jato? Como encontrar tempo para se dedicar à família, às atividades sociais e físicas?

– O dia a dia dos delegados e dos demais policiais federais vinculados à Lava Jato é extremamente desgastante e extenuante. Todos já trabalharam doentes, perderam eventos importantes da família, a maioria está trabalhando fora de suas cidades, pois ficam em missão em Curitiba, e colocando dinheiro do bolso para trabalhar, já que as diárias não cobrem o suficiente para um hotel, alimentação e transporte. Contamos, contudo, com um time de colegas policiais altamente comprometidos com sua profissão e com o Brasil. E isso é o que nos estimula a continuar, a despeito das dificuldades. Contamos também com todo o apoio que recebemos da população.

– O que a senhora ouve dos investigados, em depoimentos aí em Curitiba, chega a ser estarrecedor? Como brasileira, a senhora fica envergonhada com tamanha corrupção no País?

– Sem dúvida é estarrecedor o volume de recursos envolvidos nos esquemas de corrupção já descobertos. É chocante constatar como o sistema estava podre e como muitos empresários ganharam dinheiro no País às custas de corromperem agentes públicos. A corrupção é um câncer na economia, pois elimina a livre concorrência, afeta a utilização de recursos públicos, prejudica a sociedade como um todo. Não podemos perder nunca a capacidade de nos chocar com qualquer ato de corrupção, seja qual for o valor envolvido.

– A Operação Lava Jato vai passar pelo Espírito Santo, já que aqui está, efetivamente, a segunda mais importante unidade da Petrobras no País, com diversos postos de exploração de petróleo, gás natural e pré-sal pelo Estado todo?

– A Lava Jato não elege contratos da Petrobras ou áreas do Governo Federal para investigar. O que ocorre é que, a partir de elementos da investigação já em curso, como documentos apreendidos, monitoramentos, depoimentos, colaborações e outras informações, aparecem os indícios de uma conduta criminosa vinculada ao esquema e que deve ser investigada.

A intenção da Lava Jato não é examinar toda e qualquer obra da Petrobras, até porque a própria empresa está colaborando e imbuída de identificar qualquer irregularidade em seu seio. Cabe à Lava Jato aprofundar a investigação sobre fatos que aparecem no contexto das evidências já coletadas e que sejam indiciariamente criminosos.

Se alguma das evidências já colhidas, como documentos ou depoimentos de testemunhas, investigados ou colaboradores, apontar para a existência de algum ato de corrupção ou fraude a licitação envolvendo unidade no Espírito Santo e que tenha relação com o esquema descoberto na Lava Jato, certamente isso será objeto de aprofundamento.