Delegado Federal prega união entre Polícia Federal e MPF
Quem sairá vencedor do próximo round de disputas, desconstruções, pinimbas e corporativismos entre a Polícia Federal e o Ministério Público Federal?
Arrisco a cravar: a bandidagem do crime institucionalizado, isto é, gente como aquela, que não ficou de pé para aplaudir o Juiz Sergio Moro durante evento recente ocorrido em São Paulo.
Enquanto as duas mais importantes instituições encarregadas da persecução penal no Brasil, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, se digladiam por pontos que na verdade deveriam ensejar a soma de forças e as convergências no combate à impunidade e à corrupção sistêmica, os criminosos agradecem e a sociedade se consolida como a grande prejudicada nesse confronto descabido (entre parceiros instrumentais e necessários) que já dura quase uma década.
O Supremo Tribunal Federal se reúne durante essa semana para decidir se as polícias Civil e Federal podem ou não celebrar acordos de colaboração premiada.
A Lei 12.850/2013, conhecida como Lei das Organizações Criminosas, é clara e concede aos delegados de polícia, nos autos do inquérito policial, a capacidade de celebrar tais acordos.
Como se já não bastasse o texto legal, há inúmeros motivos para que a polícia judiciária seja contemplada com essa capacidade. O primeiro e mais robusto deles é o fato de que as colaborações premiadas – ou delações – são “meios de obtenção de prova”, isto é, se consubstanciam em instrumentos da investigação, tal qual as interceptações de comunicação, as escutas ambientais e a infiltração policial, entre outros.
Se é instrumento de investigação, deve necessariamente estar à disposição daqueles que presidem os inquéritos policiais, a saber, os delegados de polícia.
É interessante como procuradores da República respeitados, de fato verdadeiros capitais humanos do Ministério Público Federal, vêm a público elencar um extenso rol de razões para negar à Polícia Federal a possibilidade de conduzir as colaborações.
Estão na realidade – com esse discurso que defende um monopólio desfavorável ao interesse público – “marcando um desencontro”.
Enxergam mil empecilhos para os delegados atuarem nas delações, mas são incapazes de admitir que a posição estratégica da polícia em relação aos fatos, o seu contato com os alvos no calor dos acontecimentos, o seu protagonismo na fase investigativa e, principalmente, a sua superior capilaridade em relação ao parquet, a fazem legítima destinatária da capacidade em discussão. Tirar a polícia desse páreo é prestar um desserviço à sociedade.
Outra coisa: dizer que “há um risco de que a Polícia Federal vire uma segunda porta onde os afogados vão buscar um acordo, depois de terem tentativas frustradas no Ministério Público”, é um grande sofisma, pois em nenhum momento a Polícia Federal capitaneará o processo de negociação sem que seja ouvido o parquet.
Está expresso no texto da Lei 12.850/2013 que o ”delegado de polícia, nos autos do inquérito, com a manifestação do Ministério Público, poderá…”.
Logo, não há uma porta alternativa que viabilizará ao “afogado” escapar do Ministério Público. A atuação da polícia, em todo e qualquer caso de colaboração premiada, compreenderá necessariamente a manifestação do MP. Em suma, o Ministério Público é inafastável nesse processo. A previsão da atuação da polícia é o plus, isto é, trata-se de um reforço nas possibilidades de sucesso da investigação.
Aliás, a Força Tarefa de Curitiba, nos idos de 2014 até 2016, formada por policiais federais e membros do MPF, percebeu muito bem como a conjugação de esforços, a confiança mútua e a cooperação entre as instituições foi capaz de superar todo tipo de adversidade, gerando resultados formidáveis em prol da sociedade. Esse é o modelo a prevalecer em detrimento de qualquer outro.
Muitos são os exemplos de delações bem sucedidas com a participação conjunta de delegados e membros do Ministério Público. Em contrapartida, algumas colaborações fechadas sem a participação da Polícia Federal foram alvos de críticas e passíveis de revisão.
A propósito, durante a primeira metade da década de noventa, mais precisamente no ano de 1993, um braço da máfia italiana se associou a uma vertente da máfia russa nos Estados Unidos, tomando de assalto uma área considerável de Miami. Essa joint venture criminosa – diga-se de passagem, infinitamente menos poderosa e deletéria do que a delinquência política oficializada que enfrentamos hoje no Brasil – potencializou tremendamente a capacidade de lavagem de capitais e introduziu novas artimanhas para seus grupos ingressarem com armas pesadas e drogas, enfim, transformaram a cidade num caldeirão de gângsters.
Algumas instituições encarregadas do combate à alta criminalidade nos Estados Unidos, no caso em questão o FBI, o DEA, o Serviço de Imigração e Naturalização, a Divisão de Segurança do Departamento de Estado e agências locais como a Polícia de Metro-Dade (hoje Miami-Dade Police), o Xerife do Condado de Broward e a Polícia de North Miami Beach só conseguiram enfrentar o desafio e realizar diversas prisões e apreensões, de forma a fechar o cerco em relação àquelas organizações criminosas, quando foram capazes de colocar de lado as rivalidades e vaidades históricas.
Aliás, nos Estados Unidos a cooperação entre agências é um tema levado a sério. As forças tarefas são criadas há décadas para potencializar o trabalhos de promotores e policiais e, obviamente, para aparar as arestas geradas pela busca de protagonismo e holofotes.
Talvez fosse a hora de começarmos a pensar na criação de um comitê – a ser composto pelos principais atores da persecução penal no Brasil – com o objetivo exclusivo de construir pontes, buscar convergências e aplacar rusgas institucionais históricas entre essas instituições tão relevantes para a sociedade brasileira.
Enquanto homens e mulheres da Lei se desentendem, seja por filigranas jurídicas, seja por protagonismo, os criminosos de todas as matizes ideológicas se unem para continuarem agarrados ao poder, usurpando, fraudando e roubando, sempre imunes e inalcançáveis, e em eterno prejuízo da sociedade brasileira.