Divulgação de e-mails constrange ministros

24 de agosto de 2007 11:30

No bate-papo virtual, fotografado durante a sessão pública, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia debatem detalhes de seus votos, revelam a provável decisão de outro colega (Eros Grau) e discutem os desdobramentos políticos do julgamento nas disputas de poder dentro do Supremo.

A primeira e mais contundente reação ao conteúdo das conversas partiu de Eros Grau. Numa das mensagens, Cármen Lúcia diz a Lewandowski que Eros Grau lhe confessou que rejeitaria toda a denúncia do Ministério Público Federal contra os 40 acusados de integrar o mensalão: O Cupido acaba de afirmar aqui do lado que não vai aceitar nada, disse Cármen Lúcia. Ao ser abordado pelos jornalistas na entrada do tribunal, Eros afirmou, irritado:

 Perguntem ao ministro Lewandowski. Ele é que sabe tudo. Perguntem à Cármen Lúcia.

“Nunca vi isso neste tribunal”
Eros Grau não confirmou se votaria pela rejeição da denúncia. Preferiu fazer críticas à imprensa e aos colegas:

 Nunca vi isso acontecer neste tribunal. Nem a imprensa entrar e interceptar correspondências, nem esse tipo de diálogo.

Antes de começar a sessão, Eros Grau foi atendido por um médico do Supremo, que lhe tirou a pressão na ante-sala do plenário. Em seguida, os ministros se reuniram, e a presidente do STF, Ellen Gracie, sugeriu a divulgação de uma nota oficial em que o tribunal diria que o conteúdo das conversas era estritamente pessoal. Mas foi voto vencido. Ellen, então, deu início à sessão sem tocar no assunto.

Mas o clima de constrangimento ficou evidente quando o advogado Luiz Francisco Barbosa, que defende deputado cassado Roberto Jefferson (PTB), citou o assunto. Barbosa se disse satisfeito com o conteúdo das conversas em que Lewandowski e Cármen Lúcia discutem a possibilidade de rejeitar a imputação do crime de peculato (apropriação indébita cometida por funcionário público) contra alguns acusados.

 Se falava bastante, mas sempre tinha dúvida se estávamos sendo ouvidos pelos ministros. O jornal O GLOBO de hoje revelou que o nossos interesses estão sempre sendo ouvidos. É uma alegria, uma satisfação, que não diminuiu em nada esta corte  disse o advogado.

Na sessão de ontem, os ministros continuaram com computadores ligados, mas foram mais cuidadosos, e fechavam as telas ao deixar suas poltronas. Alguns preferiram conversar trocando pequenos bilhetes  em papel, não por e-mail. Gilmar Mendes chegou a mandar um bilhete que passou pelas mãos de Ayres Brito e chegou a Eros Grau.

Poucos ministros comentaram os diálogos. Lewandowski e Cármen Lúcia não responderam aos pedidos de entrevista do GLOBO. Marco Aurélio de Mello, presidente da 1aTurma do STF, citado como um problema por Cármen Lúcia, que integra o grupo, disse que o diálogo lhe favoreceu:  Penso que saí bem na fotografia.

Eu busco o cumprimento do dever  afirmou.

Marco Aurélio disse ainda não ver problema na troca de informações sobre votos entre os ministros, mas afirmou que ele não adota essa conduta:  Eu, como juiz, não costumo discutir o meu voto, mas penso que é uma questão de foro íntimo.

Carlos Ayres Britto, também citado, disse ser comum a troca de impressões entre os ministros.

Mas garantiu que não há combinação nem antecipação de votos no plenário:  Os e-mails fazem parte da rotina dos ministros. Nós trocamos impressões, como modo também de distrair. Mas aqui não existe arranjo.

Antes do início da sessão de ontem, marcada para as 10h, no Supremo, Lewandowski deixou o prédio onde mora a ministra Cármen Lúcia, na Asa Sul, em Brasília. Eram 9h55m quando ele embarcou num táxi.

Na saída do Supremo, Carmem Lúcia disse ao GLOBO que não falaria nadica.

Lewandowski afirmou que qualquer declaração sua poderia prejudicar o julgamento, ainda longe do fim. Já Joaquim Barbosa, relator do inquérito, afirmou :  É o preço que se paga pela abertura do tribunal (à imprensa) .

Na noite de anteontem, o Supremo chegou a publicar uma informação em seu site anunciando a proibição da entrada de fotógrafos ontem no plenário, mas retirou-a do ar pela manhã. Em nota divulgada ontem, o tribunal atribuiu a informação a um equívoco de um assessor de comunicação.

Na nota, o STF disse que chegou a cogitar a proibição porque os disparos intensos de flashes teriam incomodado os ministros, mas que a presidente do STF decidiu não autorizar nenhum tipo de restrição ao trabalho da imprensa.