Governo quer domesticar a PF

5 de setembro de 2007 12:00

Ligado ao PT, o novo diretor assume o cargo sob a vigência do Manual de Planejamento Operacional, uma espécie de código de regras elaborado sob o crivo do Ministério da Justiça e destinado a restringir a divulgação de prisões.

O manual recomenda a preservação da imagem, o direito à privacidade das pessoas investigadas e a presunção de inocência, na fase de apuração das operações. A PF dará continuidade às operações de impacto, mas vai evitar o vazamento de informações e restringirá ao máximo o uso de algemas e dos chiqueirinhos dos camburões onde suspeitos eram trancafiados e suas imagens exibidas. O uso do grampo telefônico como método da investigação também deverá ser restringido.

– Uma boa prova suporta qualquer pressão – disse o delegado Luiz Fernando Corrêa ao anunciar que em sua gestão, a ampla divulgação que marcou a época de seu antecessor será substituída pelo rigor da prova técnica que possa manter um suspeito na cadeia.

Antes da solenidade de posse, numa entrevista a jornalistas que cobrem a PF, Lacerda havia lembrado que a metodologia implantada durante os quatro anos em que dirigiu o órgão havia sido inspirada no programa de segurança apresentado pelo PT quando Lula disputou e venceu a primeira eleição presidencial. Segundo ele, um dos artigos do programa se referia à Polícia Federal como uma espécie de caixa preta e dizia que a corporação funcionava sem o controle do governo.

– Nós abrimos a caixa-preta através de uma política de transparência, profissionalizando o setor de comunicação. A caixa preta foi arrombada e a polícia passou por uma superexposição – explicou o diretor. Ele reconhece, no entanto, que essa foi uma fase da polícia e admite corrigir eventuais excessos.

Corrêa disse que colocará a Polícia Federal na “normalidade institucional”, aprimorando o trabalho operacional que vinha sendo feito, criando uma lei orgânica para a carreira policial e adequando o aparelho policial para a produção de provas que respaldem as operações quando elas chegarem à justiça.

– Não vamos reduzir o enfrentamento. É um processo evolutivo – disse o novo diretor, que fala em oxigenar o órgão.

Ontem mesmo ele anunciou a substituição dos sete diretores que trabalhavam com Lacerda e garantiu que, independente de quem seja o alvo das operações, “onde houver crime a polícia vai estar lá”. Corrêa diz que vai trabalhar para qualificar as provas obtidas pela polícia a fim de evitar que suspeitos sejam soltos logo depois de presos.

– Em vez de transferir (responsabilidade) temos de melhorar a prova – recomendou.

Um dos primeiros testes do novo diretor será o tratamento que a polícia dará ao inquérito que está sendo tocado no Rio de Janeiro e que tem como alvo a transação entre a Brasil Telecom e a Gamecorp, um negócio de R$ 5 milhões, envolvendo o filho do presidente Lula e o banqueiro Daniel Dantas. Corrêa disse que a investigação está em andamento e terá um curso normal. Segundo o delegado, independente de quem seja o alvo das operações, os delegados federais vão usar “no limite” a legislação contra o crime e que as prisões continuarão sendo feitas “sem fulanizar”, independente de quem esteja sendo investigado ou de pressões que a polícia possa receber.

– A pressão política será neutralizada com uma prova de qualidade – disse o novo diretor.

O novo comandante da PF, embora seja ligado ao PT, afirmou não ser filiado a nenhum partido e negou proximidade com dirigentes políticos.

Lacerda traça planos para a Abin

BRASÍLIA. Depois de uma sabatina no Senado, o delegado Paulo Lacerda assumirá o comando da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para dar uma “cara nova à agência”, conforme pedido feito na semana passada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao convidá-lo para o cargo. Lacerda deixou ontem a Polícia Federal em concorrida solenidade na sede do órgão, em Brasília, afirmando que cumpriu um ciclo na corporação: deu prioridade ao combate à corrupção na máquina pública, fez uma faxina interna na própria polícia, reestruturou e ampliou os quadros e implantou cerca de 370 operações de impacto, que deram visibilidade à Polícia Federal.

O ex-diretor disse deixa a corporação com um orçamento bem mais gordo do que quando assumiu: de R$ 1,9 bilhão em 2003, a Polícia Federal ampliou seus gastos para R$ 3,3 bilhões previstos para o ano que vem, rompendo a freqüente dependência financeira que o órgão tinha do Executivo. Lacerda disse que na nova função trabalhará para uma melhor integração entre polícia e Abin, que tem funções de Estado e o papel de informar o gabinete do presidente da República. Lacerda anunciou que vai defender o uso de escuta telefônica – hoje restrita às polícias, com autorização da justiça – pela Abin em investigações sobre terrorismo e sabotagem contra órgãos do governo.

Presente à solenidade de posse do novo diretor da Polícia Federal, o general Jorge Félix, chefe do Gabinete Institucional, a quem a Abin é subordinada, elogiou a escolha de Lacerda e também disse que é favorável a ampliação do trabalho da agência com o uso do grampo telefônico.

Anunciou que um projeto de lei nesse sentido deverá ser enviado ao Congresso nos próximos dias. Segundo o general, os agentes da Abin devem usar a escuta telefônica para proteger o país da espionagem industrial e empresarial em questões estratégicas para o governo brasileiro, como as pesquisas da Embrapa na área da agricultura e de tecnologia aeroespacial.

Biscaia confirma ida para a Senasp

BRASÍLIA O secretário nacional de Justiça do Ministério da Justiça, Antônio Carlos Biscaia, assumirá em breve a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp). Biscaia disse ontem que só precisa acertar alguns detalhes com o chefe, ministro Tarso Genro.

– Fui convidado pelo ministro Tarso Genro e conversamos muito em São Paulo. Mas ainda hoje (ontem) vamos acertar alguns detalhes e ele vai me passar as orientações para a função – disse Biscaia, que chegou a Brasília depois de rápida viagem ao Rio de Janeiro.

Biscaia assumirá o lugar de Luiz Fernando Corrêa, que comandará a Polícia Federal (PF). O ex-diretor-geral da PF Paulo Lacerda foi escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para comandar a Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Na prática, Lacerda tentará controlar a PF. A polícia tem desagradado alguns setores do governo devido a excesso de publicidade de suas ações e vazamentos de informações.

Segundo Biscaia, uma de suas prioridades será dar continuidade ao Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), que ficou conhecido como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da Segurança. O pacote reúne 94 projetos de combate à violência com a execução de ações sociais.

Ex-deputado do PT e ex-procurador-geral do Rio, Biscaia liderou ações de combate ao jogo do bicho. Na Câmara, assumiu uma posição independente em relação ao PT. Na CPI do Mensalão, defendeu a apuração completa das denúncias sem distinção de partidos. Presidiu a CPI dos Sanguessugas. E cobrou a punição dos petistas envolvidos no episódio do dossiê produzido para prejudicar o PSDB nas eleições do ano passado.