Imigrantes ilegais não têm acesso a serviços de saúde

25 de setembro de 2007 17:26

Três em cada quatro imigrantes ilegais não beneficia de cuidados de saúde, denuncia o Observatório Europeu de Acesso à Saúde dos Médicos do Mundo (MdM). E não beneficiam por três razões: desconhecem os seus direitos (33%), porque os profissionais lhes recusam esse direito (10%) ou simplesmente porque têm medo. O cenário repete-se nos oito países estudados, incluindo Portugal, apesar de ser um dos que têm uma das “leis mais positivas na Europa”, segundo João Blasques, do MdM Portugal, que irá apresentar hoje o estudo em Lisboa.

“Os ilegais desconhecem que podem recorrer a um centro de saúde ou a um hospital e que ninguém os vai denunciar. Mas os serviços de saúde e sociais também desconhecem as leis e recusam-se a prestar os cuidados ou criam barreiras, exigindo papéis que não são necessários. E, às vezes, têm atitudes incorrectas e discriminatórias”, diz João Blasques, director do departamento de acção humanitária do MdM.

A associação, sediada no País desde 1999, acaba por ter de acompanhar o imigrante aos serviços públicos para derrubar essas barreiras. E o resultado é que o processo é logo facilitado. “Temos uma legislação muito positiva no quadro europeu e, em teoria, os ilegais têm os mesmos direitos que os legais, mas quando chega à prática há muito trabalho a fazer”, critica João Blasques.

Uma situação exemplar é a que se passa com os portadores de HIV. Em Portugal, a despistagem do vírus é gratuita, o que 64,7% dos entrevistados desconhece. É o terceiro país com maior grau de desconhecimento, depois da Grécia (83,7%) e do Reino Unido (66,7%) – mas neste último os ilegais não têm acesso a medicamentos anti-retrovirais.

O estudo, a que o DN teve acesso, retrata a precariedade em que vivem os imigrantes ilegais em Espanha, França, Bélgica, Grécia, Itália, Reino Unido, Holanda e Portugal. Entre os 835 entrevistados, há quem resida no País há 24 anos, embora a média de permanência seja de dez anos.

Precariedade
40% dos inquiridos têm alojamento precário e 11% vivem na rua. A fatia dos que trabalham variam entre os 60% (Itália e Espanha) e os 34% (França). A origem dos imigrantes distribui-se por 85 nacionalidades: 33% nasceu na África subsariana e 25% na América latina. A maioria são homens (53%), metade tem filhos, mas 75% não vive com toda a família.

A nível de legislativo, 78% podem beneficiar de uma cobertura de saúde, mas só um terço conhece os seus direitos e, na prática, apenas 24% usufruem do benefício. Metade das pessoas que tiveram problema de saúde sofreram atrasos nos cuidados e 10% dizem que lhes foi recusado tratamento.

Por tudo isto, o MdM propõe uma carta de saúde para todos os estrangeiros residentes na Europa, a assegurar os cuidados de saúde para todos e a impedir que os ilegais doentes sejam extraditados.

Unidade móvel
Os Médicos do Mundo têm uma unidade móvel em Lisboa e uma equipa a pé no Porto. Em 2006, esta estrututra fez 2157 atendimentos e até 31 de Agosto deste ano prestou 1578 cuidados médicos, dos quais 43% a estrangeiros, muitos deles ilegais. Os ucranianos (147 atendimentos), os indianos (94) e os angolanos (71) são os que mais recorrem à carrinha dos Médicos do Mundo.

As principais doenças dos utentes são problemas do aparelho gástrico, doenças mentais, a que se associam comportamentos aditivos, doenças infecciosas e lesões. João Blasques diz que a situação de clandestinidade agrava o quadro clínico, além de salientar que muitas das doenças se devem a acidentes laborais cujos danos não foram tratados.

Texto original do site português