Justiça ao avesso

10 de agosto de 2007 11:56

ALÔ, MINISTRO Tarso Genro! Organizações internacionais de direitos humanos como os Repórteres Sem Fronteiras e o Human Rights Watch pediram explicações sobre a nebulosa recondução a Cuba de Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara, os boxeadores fugitivos da delegação cubana no Pan. Mas, até
agora, ninguém no Ministério da Justiça se pronunciou oficialmente sobre os procedimentos adotados no caso.

Ao mesmo tempo, ficamos sabendo que a Polícia Federal está toda, toda com a promessa de pagamento de recompensa, por parte do Departamento de Estado dos EUA, pela captura do traficante colombiano Juan Carlos Ramírez Abadía.

Ainda bem que o sempre sensato José Carlos Dias fez questão de notar que o recebimento dessa recompensa é imoral e antiético. Abro aspas para as palavras do advogado e ex-ministro: “A PF existe como instituição para combater o crime. Ela não tem de receber prêmio de país estrangeiro por cumprir seu dever”.

Do jeito que a coisa vai, enquanto os cubanos passam o pão que o diabo amassou em algum porão de Havana, é bem capaz de a Justiça decidir que o traficante colombiano deva ficar por aqui ensinando aos nossos presidiários suas técnicas, em vez de ser extraditado para os EUA. É “le monde à l”envers”, o mundo ao avesso, como diriam os franceses.

Por ter um filho com uma brasileira, Ronald Biggs pôde ficar no Rio como hóspede o quanto quis. Mas os atletas foram mandados de volta para uma ditadura que fuzila seus opositores, condena a liberdade de expressão e o ir e vir de seus cidadãos. Mais: na quarta-feira, o Supremo arquivou inquérito contra Paulo Maluf, por suposto crime de corrupção na construção do túnel Ayrton Senna. Se a Justiça sabia que o crime ia prescrever, por que não acelerou o processo? Digamos, hipoteticamente, que Maluf fosse condenado. Já imaginou a dinheirama que seria devolvida aos cofres públicos? Ou será que, no caso dos que têm dinheiro suficiente para colocar um escritório de advocacia com mais de 100 pessoas trabalhando inteiramente ao seu dispor, é só ir deixando o tempo passar, entre uma liminar e outra, até o crime prescrever?

E o que dizer da sentença do juiz Manoel Maximiano Junqueira Filho? Ele arquivou processo movido por Richarlyson contra um diretor do Palmeiras, que teria insinuado ser o atleta homossexual. Não entro no mérito da avaliação, sentença de juiz não se discute, acata-se. Mas deixo com o nobre leitor alguns trechos do parecer que, na minha modestíssima opinião, demonstram evidente saudades dos tempos em que homossexuais eram obrigados a andar com estrelas costuradas na manga. Veja: “Não que homossexual não possa jogar bola. Pois que jogue, querendo. Mas, forme seu time e inicie uma Federação. Agende jogos com quem prefira pelejar contra si”; “Não se mostra razoável a aceitação de
homossexuais no futebol, pois prejudicam a uniformidade do pensamento da equipe”; “Para não falar no desconforto do torcedor (….) de perder-se em análise dos comportamentos deste ou aquele atleta, com evidente problema de personalidade ou existencial”. Por fim, ele conclui brilhantemente: “Cada um na sua área, cada macaco no seu galho, cada galo em seu terreiro, cada rei em seu baralho”.