Nassif: No Brasil, os escândalos têm sido desperdiçados

14 de setembro de 2007 15:00

Mas no Brasil os escândalos têm sido reiteradamente desperdiçados. Surge um fato espetacular, há um tiroteio da mídia, muitas vezes abusando de ilações e de falsas acusações, que contribuem para desmoralizar as acusações pertinentes. E o objetivo final, qual é? Na maioria absoluta das vezes liquidar com a bola da vez. E só.

***

Tome-se o caso Renan Calheiros. Parte das acusações feitas a ele são de práticas comuns a grande parte de políticos e senadores. A questão das outorgas de concessões de rádios é uma delas. Muito provavelmente, se for investigar quando recebeu o presente, se irá cair na gestão Pimenta da Veiga, ou mesmo Hélio Costa. O ex-Ministro das Comunicações Sérgio Motta considerava a despolitização do sistema de concessões um dos grandes desafios da democracia brasileira. Morreu, entrou Pimenta e as práticas continuaram.

Em vez de aproveitar a questão dos supostos laranjas de Renan, para uma cruzada em favor da moralização das concessões, a campanha de mídia visou apenas Renan. Lá em Maceió, mesmo, uma das concessões de televisão é do deputado Tomaz Nonô, do DEM. Mas nada se fala porque não interesse no momento.

Quando algum interesse for contrariado, quando as circunstâncias políticas exigirem, sacam-se os escândalos da algibeira e os colocam para provocar a indignação popular  e atender a propósitos nem sempre muito claros.

***

A questão de lobistas representando fornecedores ou concorrentes de licitação pública existe em quase todos os países. No Brasil, é exagerado. A questão é que, após tantos escândalos, há um mapeamento completo dos focos de vazamento dos recursos públicos.

Existem as compras de remédios, de equipamentos de informáticas, os prestadores de serviços (vigilância, limpeza), que substituíram os empreiteiros como os grandes investidores em campanhas políticas.

Os nomes desses fornecedores são conhecidos. Tem a Confederal, no governo federal, do ex-Minstro de Lula Eunício Oliveira; tem a Tejofran em São Paulo, um quase monopólio no atendimento dos contratos públicos. Em cada estado existem as empresas que controlam esses contratos, que bancam campanhas políticas.

Se poderia aproveitar o escândalo para reduzir a margem de manobra desse pessoal, ou o subjetivismo nas contratações. Mas não interessa, porque o objetivo das campanhas midiáticas não é melhorar o país, mas mirar alvos específicos.

***

Grande parte da corrupção pública decorre do fisiologismo  de entregar cargos a aliados políticos para garantir a governabilidade. Nenhum governo escapa desse jogo. Apenas alguns são mais hábeis.

Se poderia aproveitar o escândalo para discutir o modelo político, a profissionalização das empresas públicas. Mas não interessa. O que vale é apenas o show da semana seguinte. A análise de problemas é complexa, exige estudo, suor e paciência. Mirar uma pessoa e atirar é simples, traz resultados mais imediatos.

É essa a tragédia brasileira.

[Artigo publicado no blog de Luis Nassif, nesta sexta-feira (14/9).]

Revista Consultor Jurídico, 14 de setembro de 2007