O grande teste do CNJ

6 de agosto de 2007 09:10

Criado para exercer o controle disciplinar e administrativo sobre o Poder Judiciário pela Emenda Constitucional nº 45, o órgão foi recebido com grande desconfiança nos meios jurídicos e políticos, dado o alto grau de corporativismo que sempre caracterizou a magistratura. Agora ele está diante de uma oportunidade ímpar de mostrar sua autonomia e sua independência.

Os quatro magistrados flagrados pelas interceptações telefônicas realizadas pela Operação Hurricane vendendo liminares a bicheiros e negociando propina em troca de sentença favoráveis à abertura de casas de bingo e à liberação de máquinas de jogo ilegal pertencem às instâncias superiores da magistratura. Um integra o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) sediado em Campinas. Dois pertencem aos quadros do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, no Rio de Janeiro. E um é ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a segunda corte mais importante do País, tendo no passado presidido a Associação dos Magistrados Brasileiros.

Até agora apenas o TRT e o STJ afastaram os juízes acusados pela PF. Mesmo assim, as duas cortes continuam depositando regularmente seus salários e um desses magistrados, apesar da gravidade das acusações, nos últimos meses chegou até a receber manifestações de desagravo de presidentes de Tribunais de Justiça e de diretores de Escolas da Magistratura. Desde que saíram da carceragem da PF em Brasília, os dois desembargadores do TRF fluminense estão sem trabalhar, mas, por iniciativa própria, gozando de férias acumuladas e recebendo todas as vantagens funcionais previstas pela legislação.

Como o CNJ não tem data para concluir o processo administrativo aberto contra os quatro magistrados, eles continuarão no ócio remunerado por mais tempo. Se vierem a ser condenados pelo órgão responsável pelo controle externo do Poder Judiciário, a punição máxima prevista no plano estritamente disciplinar – a aposentadoria compulsória – também não suspende o pagamento dos vencimentos e das vantagens pecuniárias acumuladas por tempo de serviço. O salário do ministro do STF acusado de vender sentenças favoráveis a bicheiros e donos de casas de bingo é de R$ 23.275.

Além disso, se os magistrados acusados pedirem demissão ou solicitarem voluntariamente a aposentadoria antes do julgamento do CNJ, o processo administrativo será automaticamente extinto. Caso recorram a esse expediente – utilizado há quatro anos por um antigo ministro do STJ acusado de vender sentenças e habeas-corpus a narcotraficantes -, os quatro juízes poderão ficar com a ficha funcional limpa, do ponto de vista formal, o que lhes permitirá praticar a advocacia nos tribunais a que serviram.

A condenação acaba sendo quase um prêmio, como diz o presidente do Conselho Federal da OAB, Cézar Britto, reivindicando mais rigor nas sanções administrativas para juízes que forem afastados por corrupção. A lei premia os magistrados que cometem irregularidades com aposentadoria. As punições do CNJ não mexem com o mais importante, que é o bolso. O dano moral é apenas meia punição , conclui.

Evidentemente, os quatro magistrados acusados pela PF terão oportunidade de apresentar suas justificativas ao CNJ e seu direito de defesa deve ser amplamente resguardado, como determina a Constituição. Contudo, se vierem a ser punidos pelo órgão, o máximo de prejuízo material que poderão ter é a perda de carro oficial com chapa de bronze, de gabinete com ar condicionado, de secretárias, de estafetas e de um lauto lanche no final da tarde.

A maioria esmagadora dos mais de 15 mil magistrados brasileiros é honesta, séria e competente. São eles os mais interessados no expurgo dos colegas que conspurcam a imagem do Poder Judiciário.