Policiais federais acusam Supremo e PGR de censura

22 de maio de 2014 13:23
 

O sigilo absoluto decretado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos inquéritos decorrentes da operação Ararath, desencadeada no Mato Grosso em 2011, deu início a intenso embate público com contornos de crise entre a Polícia Federal (PF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR). A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) divulgou nota pública classificando o episódio de censura. O pedido de segredo nas investigações feito pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot e aceito pelo ministro do STF Dias Toffoli, foi considerado um "cala boca oficial" por delegados em todo o País.

 

A investigação da PF indicou envolvimento de servidores dos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e também do Ministério Público estadual do Mato Grosso, em esquema milionário de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro por intermédio de "factorings" de fachada, empresas negociadoras de créditos, segundo a polícia.

 

A investigação teve a sua quinta fase iniciada na terça-feira com a prisão do governador do Mato Grosso, Silval Barbosa (PMDB) – flagrado por porte ilegal de arma e solto após pagamento de fiança – do deputado estadual José Riva (PSD), presidente afastado da Assembleia Legislativa, e do ex-secretário de Estado de Fazenda, Eder Moraes Dias, que presidiu a Agência Estadual de Execução dos Projetos da Copa 2014, além de outros suspeitos entre cerca de 60 investigados.

 

Na Polícia Federal o entendimento é que a instituição está sendo retaliada por "ousar" investigar um promotor de Justiça. Marcos Regenold, integrante do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) do Mato Grosso, também teve sua residência e sala de promotoria devassados pelos federais durante as buscas autorizadas pela Justiça. A suspeita dos responsáveis pela Ararath é que o integrante do Ministério Público Estadual (MPE) teria atuado em conjunto com o ex-secretário para interferir nas investigações da PF. Em nota o MPE afirmou que "todo o histórico da atividade executada pelo promotor foi comunicado pela Procuradoria Geral de Justiça ao Ministério Público Federal por meio de ofícios". De acordo com o órgão, o ex-secretário da Fazenda teria procurado o integrante do Gaeco em dezembro do ano passado para apresentar documentos e versões sobre os objetos investigados pela operação Ararath.

 

Em transcrição de escuta telefônica judicialmente autorizada 19 de fevereiro deste ano, data do cumprimento do mandado de busca e apreensão na residência do ex-secretário, Dias telefona para Regenold e avisa que a Polícia Federal está em sua casa: "Estou aqui com seis, sete policiais federais. Doutor Rômulo", avisa o ex-secretário, que em seguida pede ao promotor: "Dá uma olhada com o pessoal". O promotor, então, questiona se é outro mandado judicial. Dias responde que foi "expedido pelo Jeferson Schneider [juiz da 5ª Vara Federal]". "O que me pediram para fazer eu fiz, né?", diz o ex-secretário de Estado. O promotor responde surpreso: "Cara, que estranho, bicho". E prossegue: "Mas você tem coisa aí?", indaga.

 

Em relatório a PF critica a conduta do promotor: "Este não é o comportamento que se espera de um membro de tão relevante instituição como o Ministério Público", considera. "Sua transcrição se faz relevante, no entanto, pela gravidade e atualidade das ações em curso, especialmente, mais uma vez, no sentido do potencial que têm para afetar o escorreito andamento das investigações", diz o documento da Ararath.