Prédio da ONU sofre atentado

12 de dezembro de 2007 11:40

Duas explosões na capital argelina, Argel, deixaram ontem ao menos 62 mortos, segundo fontes médicas, número que transformaria os atentados nos mais sangrentos do país na última década. O Ministério do Interior da Argélia, no entanto, contou 26 mortos e ao menos 177 feridos, embora os trabalhos de resgate não tivessem se encerrado até a noite de ontem.
Os alvos dos ataques, reivindicados pela Al-Qaeda do Magreb Islâmico, foram escritórios da ONU e do governo argelino. Apesar do nome, a origem da militância do grupo terrorista na Argélia não é a mesma dos responsáveis pelo 11 de Setembro. Em comunicado na internet, o grupo revela os nomes dos suicidas que conduziram os dois carros-bomba: Abdul Rahman al-Aasmi e Ami Ibrahim Abou Othman. O mesmo comunicado referia-se à ONU como QG dos infiéis internacionais.
O ministro do Interior da Argélia, Noureddine Yazid Zerhouni, disse que os extremistas já tinham a ONU em mira.
A primeira explosão, ocorrida às 9h30 locais (7h30 no horário do Recife) e separada da segunda por cerca de dez minutos, aconteceu no bairro de Hydra. O ataque atingiu escritórios do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e do Acnur (agência da ONU para refugiados), matando pelo menos 11 funcionários da entidade. Em entrevista à BBC, António Guterres, chefe do Acnur, declarou não ter dúvidas de que a ONU era o alvo.
O secretário-geral da entidade, Ban Ki-moon, condenou os atentados, qualificando-os de inaceitáveis e injustificáveis. O ataque trouxe à memória o atentado de 2003 às instalações da instituição em Bagdá, quando foram mortas 22 pessoas, entre elas o brasileiro Sérgio Vieira de Mello.
A segunda explosão deu-se diante do Conselho Constitucional da Argélia, no bairro de Ben Aknoun. O conselho julga a constitucionalidade das leis argelinas, além de supervisionar as eleições no país. O impacto despiu o prédio recém-inaugurado de sua fachada e atingiu, entre veículos e pessoas nas redondezas, um ônibus escolar. Segundo o New York Times, o veículo levava alunos da Universidade Ben Aknoun.
Nós condenamos veementemente os ataques terroristas aos escritórios das Nações Unidas por esses inimigos da humanidade, declarou o presidente dos EUA, George W. Bush, que tem na tentativa de conter o ativismo islâmico no Oriente Médio e na África uma de suas principais preocupações. A declaração, que inclui condolências às famílias dos mortos, foi lida por Gordon Johndroe, porta-voz do Conselho de Segurança americano.
Nicolas Sarkozy, presidente da França, antiga metrópole da Argélia, também se manifestou, chamando os atentados de odiosos e covardes. Condenações e condolências partiram ainda da União Européia, do presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, e do governo espanhol, entre outros Estados e entidades.
Desde 1992, quando o governo do país e o Exército uniram-se para invalidar uma eleição que seria vencida por radicais islâmicos, a Argélia tem sido palco de vários atentados.
Este ano foi particularmente violento no país, com atentados matando mais de cem pessoas. Dois dos maiores foram em abril, quando 30 pessoas foram mortas, e em setembro, quando dois ataques mataram 50.

Extremismo
A Argélia tem seu próprio histórico de extremismo religioso, nascido em 1991 quando a FIS (Frente Islâmica de Salvação) teve sua vitória eleitoral solapada pelo Exército, seguindo-se uma guerra civil que até 2002 matou 100 mil pessoas e deixou 18 mil desaparecidas.
A militarização do FIS era inevitável. Dele surgiu o EIS (Exército Islâmico de Salvação), que tem apenas um parentesco remoto com a minoria jihadista, articulada em 1998 como o clandestino Grupo Salafista pela Pregação e Combate, do qual faziam parte até oficiais de média patente, desertores das Forças Armadas.
Desde janeiro último o grupo passou a se autodenominar Organização da Al-Qaeda do Magreb Islâmico (denomina-se de Magreb a região do norte da África que abrange Marrocos, Saara Ocidental, Argélia, Tunísia, Mauritânia e Líbia). A menção à organização de Osama bin Laden funcionou como forte chamativo, sem que existam evidências de subordinação hierárquica ao terrorista que se supõe escondido na fronteira do Paquistão com o Afeganistão.
Os serviços de inteligência ocidentais temem e consideram perigosíssimo o processo não linear de radicalização islâmica na Argélia. Ao mudar de nome, o grupo  do qual desertaram 300 militantes, beneficiados pela anistia de 2005  procurou também renovar seus quadros por meio da atração de extremistas de outros países norte-africanos e veteranos da insurgência do Iraque.